O talento que se cria, passo a passo
A mestria atinge-se com prática, muita prática.
“É preciso ter ouvido para a música”, “Eu gostava, mas não tenho jeito e agora já é tarde”, “O meu filho gosta de guitarra, mas não sei se tem muito jeito”
Basta uma breve pesquisa na Internet para nos mostrar que parece não haver limites para a capacidade humana. Os recordes estão constantemente a ser superados, a mestria atinge-se cada vez mais cedo. Fica também reforçada a ideia de que alguns de nós nasceram com um talento inato, que possuem uma inteligência fora do habitual e que para os restantes só resta sonhar.
Por outro lado, há quem tente. Há quem tente com todas as forças e com toda a dedicação, sem chegar ao ponto em que a atividade começa a retribuir a satisfação e realização desejadas. A vontade é mais do que suficiente, mas "é preciso ter jeito".
Vários estudos realizados sobre aprendizagem, seja no desporto, na música, na matemática ou xadrez, concluem que existem efetivamente fatores genéticos que conferem uma vantagem inicial. Essa vantagem pode ser determinada através dos nossos dados biométricos (peso, altura, proporção geral), ou através da medição do Coeficiente de Inteligência (QI), com testes standarizados.
Mãos grandes podem ser uma vantagem na aprendizagem do piano; estatura acima da média garante um lugar efetivo na equipa de basquetebol; uma perceção espacial apurada permite-nos entender com maior facilidade a complexidade do xadrez.
Para a maioria de nós, este é o fim da discussão. Melhores genes, maior inteligência, maior capacidade.
Ao acompanharem centenas de praticantes, nas mais variadas atividades, ao longo do desenvolvimento das suas capacidades, os investigadores concluíram que estes fatores conferem apenas uma vantagem inicial. Os mestres não são necessariamente aqueles com o QI mais elevado, ou com as características físicas mais vantajosas para a atividade em questão.
A mestria atinge-se com prática, muita prática.
A ideia das 10.000 horas tornou-se num lugar-comum das discussões acerca da aprendizagem. O conceito diz-nos que para atingir o mais alto nível em qualquer área, temos de investir algo próximo desse número de horas. Na verdade, essa grandeza é uma média que varia de acordo com a atividade e com o indivíduo. O importante é praticar, e muito.
A água e o vento moldam a pedra incessantemente, mas apesar dos milhões de anos de prática, a probabilidade de criar uma cópia do David, de Miguel-Ângelo, é quase nula. O ser humano tem a vantagem de observar a própria criação, de a criticar e aperfeiçoar. Praticar com um propósito, um foco.
Nestas duas ideias reside o segredo da mestria: Praticar de forma orientada e persistir.
Diogo Chaves